O negão Arcênio Bacamarte, três metros de altura, dois de largura, voz de gralha, sorriso banguelo, um doce de pessoa, mais conhecido pelo carinhoso apelido de Escopeta, namora a negona Zefinha, de todos conhecida pelo singelo nome de raspa a mandioca. É que quando está nervosa, já sabe.
O amor entre os dois é conhecido em toda a região.
E depois de muitos anos resolveram oficializar a vida conjugal. Um dia moravam na casa de Zefinha e no outro na casa de Zefinha. É que Escopeta “andava” meio sem grana, trabalho longe, vontade mais distante ainda, aquela preguiça e a negona bancava as contas. Dessa vez, passarão todos os dias na casa de Zefinha.
Mas a negona impôs uma condição. Devia Escopeta se confessar. Os olhos do negão se arregalaram.
Mas flor será que o senhor padre está preparado para “auscutar” o que sai da “caixa do peito” do negão? Nega, ele não consegue nem ouvir a parte que vai da barriga da mamãe até a figura aqui nascer.
Não tem desculpa. Se não confessar não tem casório. Só casa puro. Tem de tirar os pecados. Se não confessar nem volte. Resignado, Escopeta concordou.
Enquanto caminhava em direção à igreja perto do morro onde morava Escopeta resmungava o tempo todo. Pensamento apertado, garganta seca, quase esgotada, mão suada, um horror de ansiedade e de vergonha. Esta nega me paga. Como pode pedir a um cara como eu para confessar. Se o padre quiser manda prender na hora. E não tem mais casamento.
Para sua sorte ou azar viu um amigo ao largo. Por precaução, Escopeta consultou o amigo de farra. Péu, psiu, psui, Péu, me ajuda aí camarada, se eu confessar ao padre que mantive relação sexual com a "jegua" lá da rua, o "home" me perdoa e não fala nada para a Zefinha? Pô Escopeta. Isto não é pecado. Que alívio, disse Escopeta.
E lá se foi o feliz Escopeta.
Chegou na igreja e logo se anunciou com voz rouca e quase sóbria. Só havia bebido duas garrafas de Fogo, Foguinho, pinga da melhor qualidade, fabricada no alambique de Chimbica, nos fundos do oficina de Camonga. Seu padre quero confessar agora. Apareceu um padre franzino quase invisível e com voz “pálida” quase sumida falou: Meu filho você pode vir mais tarde. Escopeta não concordou.
Seu Padre tem de ser já, enquanto tenho coragem para contar. A nega Zefinha disse que se não confessar não casa comigo. E se ela não casar eu... O padre não deixou terminar. Claro, meu filho. O motivo é bem forte, muito forte. Olhou os braços do negão. É muito forte.
Seu Padre tem de ser já, enquanto tenho coragem para contar. A nega Zefinha disse que se não confessar não casa comigo. E se ela não casar eu... O padre não deixou terminar. Claro, meu filho. O motivo é bem forte, muito forte. Olhou os braços do negão. É muito forte.
Fica ali naquela casinha. Vou aparecer lá dentro e tem um lugar para você falar, disse o Padre. Já vou para lá, disse Escopeta.
O Padre chegou, sentou, abriu a portinha do confessionário, ouvido colado, espírito preparado para o pior, pediu para Escopeta falar.
Padre, primeiramente quero falar que, não sei como dizer. Fala, meu filho. Sou o mensageiro de Deus. É como se estivesse falando com ele. É seu Padre, disse Escopeta, tape os ouvidos. Não posso, meu filho. Para te perdoar preciso saber seus pecados.
Escopeta bem baixinho disse. Transei com a "jegua". Não ouvi meu filho. Padre surdo, disse Escopeta. Isto eu ouvi. Mas não é isto, Padre. Eu transei com a "jegua" lá da rua, disse o envergonhado Escopeta. Não se envergonhe. Muitas crianças fazem estas peraltices. Mas foi a semana passada, Padre. O Padre disse. Reze dez aves marias e 50 pais nossos. Nega safada. Veja onde Zefinha me meteu. Não vou beijar aquela nega por um dia todo.
O Padre para se livrar de Escopeta disse que faria apenas uma pergunta. Se respondesse certo estaria livre de todos os pecados. Preparado? Escopeta respondeu que sim. Lá vai. Quantos são os pecados capitais? Cuma?
Não enrola, quantos são os pecados capitais? É, pecados da capital. Não, Escopeta. Pecados Capitais, corrigiu o Padre. Foi o que eu disse, pecados da capital. Essa nega vai me pagar. E se eu dissesse que são 3. Quantos? Perguntou o Padre. Se eu dissesse, mais não disse. Ainda não dei a resposta definitiva. Pecados da Capital. Quantas chances eu tenho? Ô Escopeta. Nada Padre só foi uma pergunta à-toa.
Será que são... não, não é, desistiu ao perceber que o Padre ficou espantado. E aí, Escopeta. Calma seu Padre. É pergunta muito difícil. Padre dá umas dicas, afinal somos todos Framengo. Vou ficar sem fazer "sexu" com aquela nega por “dois dia”.
Pecados da Capital. Fala Escopeta. Calma Padre, estou pensando. Escopeta suava mais que cuscuz. Se ele não acertasse o Padre diria que ele não passou certo pelo confessionário e Zefinha não casaria com ele. Que dureza, seu moço.
O sujeito estava alucinado. Imagine perder aquela negona dos "peito" grande, bunda cheia, pernas longas e bonitas, uma flor, por não saber os pecados da capital, como dizia ele. Será que dirigir bêbado é um dos pecados da capital? Não, não é. Isto é crime. Zé Colméia pegou uma cana por isto, nas Oropas. Quase não volta. Mas foi lá, aqui ninguém é preso. Nem paga indenização, quanto mais. E quer quantos e não quais. O pensamento viajava na cabeça de Escopeta.
E se eu dissesse que conheço todos os pecados do morro? Será que não vale nada, já que pouco vou na capital? Não, ele não vai aceitar. O Padre encasquetou que quer os pecados da capital.
Que mania desse Padre. Vai queimar meu filme com Zefinha. Vou dizer que estava pensando em contribuir com a igreja. E se ele acreditar e quiser que comece agora? Melhor não arriscar.
Vamos Escopeta. Se você não falar agora vou reprovar você. Treze, não, vinte e três, não, trinta e três sussurrou Escopeta. Ora, Escopeta, você não sabe. Vá estudar a bíblia e depois volte.
Frustrado Escopeta sai da igreja. Na saída encontra um amigo e grita. Bate Estaca, Bate Estaca. “Quié” Escopeta. Vai para a igreja? Você vai se confessar? Vou. Se prepara que o Padre quer derrubar a gente. Quantos são os pecados da capital? Você quer dizer pecados capitais, não? É, quantos são. Ora Escopeta todo mundo sabe que são sete. Quantos? Sete. Vai lá com esta mixaria. Eu disse trinta e três e ele me expulsou. Fala isto e o Padre te esmaga.
E Escopeta saiu sem entender nada e menos ainda Bate Estaca.
É como dizia o folclórico ex-presidente cotintiano, durante um festival de chop no Parque São Jorge (sede do Corinthians): "Obrigado à Antártica pelas braminhas que mandou".
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